Trabalhando com Informática na Educação Infantil
O cúmulo da cegueira é atingido quando antigas técnicas são declaradas culturais e impregnadas de valores, enquanto que as novas são denunciadas como bárbaras e contrárias à vida. Alguém que condena a informática não pensaria nunca em criticar a impressão e menos ainda a escrita. Isto porque a impressão e a escrita (que são técnicas!) o constituem em demasia para que ele pense em apontá-las como estrangeiras.(LÉVY, 1993, p.15)
Um dos maiores “burburinhos” no meio educacional é como proceder com a Informática na Educação Infantil. Alguns radicalmente contra, outros totalmente a favor e alguns nem contra nem a favor, ou seja, não há unanimidade quanto este uso. Mas um fato é que estes alunos estão vivenciando seu mundo e este mundo tem a Informática como algo fundamental na existência. E, sem contar, a própria curiosidade dessa faixa etária ao ver os pais, irmão, familiares e etc, trabalhando, se divertindo, comunicando com um PC ou um notebook. E eles querem participar, afinal, devem pensar “também sou filho de Deus”…
Mas como professores e escola devem proceder com tais máquinas e os pequenos? Abaixo um excerto de um texto em que sou co-ator com algumas dicas sobre o ato de pensar a Informática para a Educação Infantil.
Gallo (2002) aponta que em 1998 as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil já trazem incentivo para o uso das tecnologias na educação:
“Ao reconhecer as crianças como seres íntegros, que aprendem a ser e conviver consigo próprias, com os demais e o meio ambiente de maneira articulada e gradual, as Propostas Pedagógicas das Instituições de Educação Infantil devem buscar a interação entre as diversas áreas de conhecimento e aspectos da vida cidadã, como conteúdos básicos para a constituição de conhecimentos e valores. Desta maneira, os conhecimentos sobre espaço, tempo, comunicação, expressão, a natureza e as pessoas devem estar articulados com os cuidados e a educação para a saúde, a sexualidade, a vida familiar e social, o meio ambiente, a cultura, as linguagens, o trabalho, o lazer, a ciência e a tecnologia (Parecer CEB022/98, MEC).”
Podemos entender que a Educação infantil, ao trabalhar com sujeitos em formação pode utilizar-se de recursos informatizados desde que articulados com uma proposta pedagógica sustentada pelo coletivo escolar. Desta forma, a informática não será vista como vitrine, como mero atrativo para pais e alunos.
Valéria Santos Paduan Silva (2000) descreve experiências no âmbito da educação infantil, enfocando o trabalho docente, em especial no tocante à formulação de projetos e sua implementação. Como exemplo de atividades que utilizam o computador foram citados trabalhos para desenvolver a relação espaço-temporal e o raciocínio lógico-matemático, desenvolver noções de espaço (direção, posição e disposição no espaço) e de tempo (ritmo, seqüência temporal, agora, antes, dia, noite, etc.), desenvolver a coordenação viso motora, identificar as formas geométricas, cores, seqüência numérica e seqüência lógica. Mas para isso tudo, deve-se escolher softwares que estejam de acordo com a proposta pedagógica.
Portanto, uma questão fundamental são os critérios para escolha do software (seja ele, tido como educacional ou não, já que muitos softwares que não compõe o universo dos chamados educacionais, podem, muito bem, servir para esse propósito. Sobre como escolher um software para educação leia “A avaliação de um software educacional tanto para a modalidade presencial quanto para EAD” clicando no link). Essa situação é primordial quando se fala em utilizar a informática na Educação, já que o apelo comercial e as inúmeras propostas de softwares “milagrosos” estão recheando o mercado e induzindo professores e pais a adquirirem essas “fabulosas máquinas de pensar”. O professor, seja de qual etapa do ensino (do infantil ao universitário) deve e precisa conhecer e ter critérios para a escolha do software de acordo com o grau dos seus alunos e com as propostas pedagógicas que ele destinou à sua atividade de ensino. Como exemplo, apresenta critérios interessantes para que possamos analisar softwares destinados à educação infantil. São eles:
a) O material fornece condições para as crianças expressarem suas idéias em: imagem, som, palavras e música;
b) O programa oferece ajuda sob a forma oral para a criança;
c) O programa oferece ajuda sob forma escrita para a criança;
d) O programa permite que a criança dê outras soluções para as questões que propõe, diferentes daquelas que apresentadas por ele;
e) O programa permite que a criança possa expressar-se através da escrita;
f) O programa permite que a criança possa comparar o que escreveu com a escrita convencional;
g) Os recursos multimídia do programa proporcionam contato com diferentes formas de escrita;
h) O programa permite que as atividades proposta sejam impressas;
i) As atividades impressas possibilitam situações de leitura e escrita.
E, em suas conclusões aponta que:
“Os programas analisados ficaram muito aquém do desejável para aquilo que buscamos como possibilidades de enriquecimento do universo infantil no que concerne à leitura e à escrita. Em sua esmagadora maioria, não atingiram o percentual mínimo para que pudessem ser enquadrados como possibilidades concretas de estímulo à formação de crianças leitoras e escritoras. Os exercícios, limitados à repetição de estratégias há muito utilizadas pelas cartilhas escolares, têm no suporte multimídia a ilusão da novidade e apostam nisso para que as crianças aprendam. (p. 102)”
Sendo assim, entende-se que a relação entre educação infantil e informática na educação deve seguir um projeto político pedagógico, ancorado na contextualização nos modos de vida de uma determinada região. Neste sentido, a escuta desta realidade, a proposição de atividades deve vir mediada em relação com professor e alunos. Os elementos de atração de um software (cor, movimento, som) não devem ser tratados como fundamentais, mas sim como componentes que irão se acoplar à proposta pedagógica da escola e do professor.
Outra questão primordial são os apelos utilizados para o marketing do software. Muitos prometem o que não podem cumprir e são vendidos como se fossem embasados em fundamentos construtivistas e, na verdade, não atingem os pressupostos básicos para serem chamados como tal.
Daí a necessidade da coerência pedagógica do professor somada a conhecimentos, pelo menos, superficiais de modelos de softwares e sua arquitetura, bem como seguir uma espécie de checklist que contenha critérios que são fundamentais e importantes para comporem o software que o professor deseja de acordo com suas necessidades e estratégias pedagógicas. Acima, apresentamos um exemplo de avaliação de software educacional, mas a lista pode ser acrescentada ou diminuída de quaisquer situações que sejam do agrado e de acordo com as estratégias do professor e da escola que se destina o software.
João da Silva Filho descreve perspectivas interessantes ao se pensar no uso de computadores na educação infantil:
1. a introdução das novas tecnologias no âmbito da educação infantil não descartará a figura do professor;
2. a introdução das novas tecnologias no âmbito da educação infantil implicará, sim, na necessidade de uma nova postura por parte do educador e na apropriação de novas habilidades por parte deste;
3. entre estas habilidades novas exigidas pela inserção destas tecnologias emergentes na educação infantil, destaca-se a capacidade de lidar com os equipamentos e os programas a nível prático-reflexivo, quer dizer, a nível do saber-fazer e do saber-saber (o que utilizar, como utilizar, quando utilizar, por que utilizar, etc.)
4. a existência de diferentes propostas educacionais para o trabalho educativo como “…ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (DUARTE, 1998, p.85) exige uma tomada de posição por parte dos educadores na hora de decidir de que maneira incorporar estas tecnologias emergentes em seu trabalho com as crianças pequenas;
5. há uma prática social contraditória que envolve as promessas de um projeto cultural de emancipação e cidadania, e esta contradição reflete-se nas possibilidades de se fazer uma educação coerente com a finalidade de produzir-se uma sociedade mais humana, mais democrática e mais solidária;
6. a introdução destas tecnologias na educação infantil, tanto como objeto de estudo quanto como ferramenta pedagógica, deve cumprir uma função primordial de socialização da cultura e de contribuição que ajude a superar as desigualdades sociais e os entraves a uma cidadania plena;
7. as propostas pedagógicas e as concepções ensino-aprendizagem que subjazem sob parte considerável dos softwares educativos para crianças pequenas ainda não incorporaram propostas mais modernas que levam em conta a importância da atividade e iniciativa da criança no processo de integrar-se a uma cultura e de constituir-se como sujeito;
8. muitos dos materiais disponíveis, principalmente programas(softwares), apresentam problemas de instalação, manipulação e uso, atrapalhando a incorporação dos mesmos no cotidiano da educação infantil;
9. em muitos programas para crianças pequenas ainda é possível identificar conteúdos que veiculam estereótipos violentos e discriminatórios em relação a gênero, raça, religião, costumes, etc. (1998, p. 8-9)
Além das questões que Silva Filho apresenta não podemos deixar de lado as características desses “novos tempos”. Hoje, a Informática faz parte da vida cotidiana de crianças a adultos, todos a utilizam de alguma forma, seja para o entretenimento quanto para o trabalho e os computadores estão presentes em todas as camadas da população, havendo, inclusive, um aumento significativo nas camadas populares. As últimas estatísticas do uso de computadores no Brasil mostram uma realidade em crescimento vigoroso do seu uso. Inclusive, o Brasil é campeão mundial em horas navegadas na Internet e os números não param por aí: somos 66,3 milhões de internautas segundo o Ibope Nielsen Online (em 12/2009), um aumento de 16% em relação a 2008. O Brasil é o 5º país com o maior número de conexões à Internet. Nas áreas urbanas, 44% da população está conectada web e de cada 3 escolas urbanas, 2 tem laboratórios conectados à Grande Rede com banda larga. 97% das empresas e 23,8% dos domicílios brasileiros são conectados.
Dessa forma, o computador começa a universalizar-se adentrando em todas as camadas da população e, assim, o processo educativo não pode se manter alheio a esse movimento. E, muito menos, a educação infantil pode ser desconhecedora dessa realidade. Uma parte considerável das crianças brasileiras mora em lares que tem acesso ao computador ou tem pessoas que o utilizam de alguma forma no seu cotidiano, tornando-se algo corriqueiro nas conversas e na lida do dia-a-dia e, além disso, não podemos fazer do laboratório de Informática da Escola o local onde mora “o bicho papão”, afinal, onde ele habita criança não entra !
- Lilian Carvalho Donato ♣
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